VISÃO DA TRAGÉDIA


Não dá para não falar, não dá para não se chocar e indignar com a miséria humana. E a miséria de hoje vem da alma, da índole perversa, louca e criminosa do assassino que invadiu uma escola e matou (até o momento) 12 crianças acuadas e totalmente indefesas no Rio de Janeiro. E é só isso que vou falar desse assassino, que não merece qualquer notoriedade, referência e pensamento, nem mesmo odioso.

A tragédia já ocorreu e nossa sociedade está percebendo que não apenas existem loucos nos Estados Unidos, talvez mais lá do que aqui, e que não estamos imunes a esse tipo de ocorrência criminosa apenas por que estamos abaixo da linha do equador (lembram-se do estudante de medicina Mateus da Costa Meira, que em 1999 atirou contra as pessoas dentro de um cinema em São Paulo?). 

Entramos agora num estado de estresse pós-traumático generalizado, em que todos procuram entender o porquê de tudo isso, como poderia ter sido evitado e o que fazer de agora em diante. Dessas questões, apenas a última é pertinente e deve ser abordada e discutida. Por que tudo isso aconteceu, já faz parte do domínio do passado e a resposta se foi com o assassino, se ficarmos perdendo nosso tempo com tal indagação só iremos reverenciar esse assassino e patinaremos no mundo sem respostas das conjecturas. Ao nos perguntarmos sobre se isso poderia ter sido evitado, também não vamos conseguir alterar nada e vamos acabar atribuindo culpa a outros que não ao único responsável por essa tragédia - o assassino abatido. Não há outros culpados. O Estado (a escola) não poderia ter feito nada nesse caso. Ou será que queremos as escolas dos nossos filhos como prisões? Isso seria subverter a ideia de escola como espaço de convivência, de aprendizagem, de diálogo e de trocas. A terceira questão sim, é pertinente: o que podemos fazer de agora em diante? Qual reflexão nós, sociedade, e o Estado devemos fazer sobre tais acontecimentos com vistas ao futuro? O que isso tudo pode nos ensinar?

Já se fala em nova campanha de desarmamento; ótimo, vamos discutir e agir. Mas não podemos esquecer que estamos lidando com a mente humana, com desajustes mentais, então, talvez devêssemos aproveitar a situação para discutir também sobre saúde pública, já que as doenças da mente têm sido apontadas como pano de fundo de tantas tragédias. Nesse ponto o Estado pode e deve ser demandado no sentido de olhar e tratar com eficiência e responsabilidade doenças marginalizadas como esquizofrenia, depressão e perturbações ansiosas (fobias, perturbações de pânico, perturbações obsessivo-compulsivas), não deixando a cargo unico e exclusivo da família tratar de doenças tão sérias e delicadas como se fossem uma gripe. Assim como o corpo, a mente precisa de cuidados e, como se viu, o potencial lesivo de um doente não tratado é imenso.

Não estou aqui tentando escusar o assassino, até porque desse indivíduo não me interesso em falar - ele saiu do nosso plano, irá responder perante a Lei Divina (muitas vezes mais cruel que a humana) - mas tentando realçar em meio à tragédia uma lacuna que sempre fica em aberto quando crimes dessa ordem se abatem sobre a sociedade, talvez exatamente pelo pensamento popular de que atribuir a um assassino o status de doente seja uma tentativa de torná-lo inimputável e transformá-lo em coitadinho. Mas não é nada disso, eu entendo que assassino é assassino, mas que existe uma chance desse tipo de acontecimento ser contido e controlado, exatamente pela compreensão e enfrentamento dessas doenças como questões de saúde pública, em que o Estado não pode se eximir de atuar.  

Que Deus abençoe e conforte as famílias que perderam seus filhos. Dor maior não existe.

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